Visão da maternidade a partir das relações sociais
“Ser mãe é f*d@!”, livro de Ana Luiza de Figueiredo Souza, reúne informações sobre o “ser” e “não ser” mãe na era digital
Pesquisadora, escritora e consultora acadêmica, Ana Luiza de Figueiredo Souza acredita que uma das formas de se fazer investigação científica é olhar para o cotidiano social. Baseada na pesquisa vencedora do Prêmio Compós e na própria atuação em campo de Ana Luiza, a obra Ser mãe é f*d@! traz os diferentes cenários da maternidade e da não maternidade em tempos de acalorados debates nas redes sociais.
Em busca de ampliar a visibilidade de diferentes temáticas maternas, a autora se aprofunda nesse assunto para analisar os movimentos históricos que o cercam, sejam eles políticos, econômicos, socioculturais ou tecnológicos.
Além desse livro, Ana Luiza tem em seu currículo prêmios literários, científicos e publicitários e possui materiais publicados em sites, revistas, antologias, periódicos acadêmicos tanto nacionais quanto internacionais e obras selecionadas para o catálogo da Feira de Bolonha, acervo básico da FNLIJ e mostras de teatro.
Em entrevista, a pesquisadora revela um pouco mais sobre a sua pesquisa de mestrado que resultou na publicação literária Ser mãe é f*d@!. Confira a conversa com a escritora:
Como foi fazer uma análise de como a expectativa da maternidade afeta relações sociais?
Ana Luiza: Potente e, em muitos sentidos, reveladora. Faço um mergulho profundo, atento, no qual trago as vozes de diferentes mulheres: desde pesquisadoras até mães e filhas que debatem a maternidade nas redes. O empenho por trás desse trabalho é para que ele possa ajudar a construir uma sociedade mais justa e sustentável para nós, mulheres.
Você trouxe a experiência de não querer ser mãe para a obra, como foi expor essa questão pessoal no livro?
A.L.: Em um livro que discute as variadas vivências maternas que se cruzam nas mídias sociais, acredito que dividir a minha com os leitores contribui para a transparência e a honestidade da pesquisa. Sou uma mulher como aquelas que me leem, com memórias, posicionamentos, dores. A diferença é que eu transformei o que percebia ao meu redor em pesquisa.
Você acredita que a mulher que tem uma maternidade compulsória está mais propensa a desenvolver problemas relacionados à maternagem?
A.L.: Algo que as narrativas investigadas no livro revelam é que mesmo quando escolhida de forma consciente e planejada, a maternidade pode ser difícil e até causar arrependimento. Mas se uma mulher que sequer cogitava ter filhos de repente é empurrada para a posição de mãe, em uma rotina de maternagem, isso pode ser ainda mais traumático. Outro cenário é quando uma mulher que cresce em um meio em que a maternidade não é questionada ou problematizada se torna mãe e passa a vivenciar uma série de problemas que ela até então não sabia que existiam. Essa quebra de expectativas pode ser dura, brusca e gerar o sentimento de ter sido enganada, traída. No fundo, a maternidade compulsória priva as mulheres de conhecimento e de liberdade.
A temática childfree é muito debatida na internet, o que é esse termo facilmente confundido com aversão às crianças?
A.L.: Childfree é um termo usado para designar pessoas voluntariamente sem filhos. Em países anglófonos, passou a ser feita a distinção childfree by choice, para enfatizar que a ausência de filhos é voluntária. Acredito que um grande motivo para o associarem a algum tipo de aversão às crianças é a palavra “child”. Em inglês, “child” não significa apenas “criança”. É um modo de se referir a filhos, independentemente da idade deles. Mas quando essa expressão chega ao Brasil, começa a ser lida como “sem crianças”. Isso se junta a dois outros fatores: espaços comerciais que se colocam como childfree por não atenderem clientes abaixo de determinada idade (em geral, menores de 14 anos) e conteúdo intitulado childfree nas mídias sociais que debocha de crianças e seus cuidadores.
Qual a diferença entre maternidade e maternagem?
A.L.: Resumidamente, maternagem é o conjunto de atividades relacionadas ao cuidado e à criação de uma ou mais pessoas. Alimentação, higiene, orientação, amparo afetivo, por aí vai. Já a maternidade é uma instituição cultural e simbólica colocada como uma das principais – em muitos casos, a principal – referência(s) da identidade feminina. Geralmente, aquela que ocupa o papel de mãe materna aqueles que considera seus filhos. Mas é possível ser mãe sem maternar, bem como é possível maternar sem ser mãe.
No fundo você propõe uma grande conversa sobre o ser mãe ou não ser, mas também sobre o ser filha?
A.L.: Com certeza. De um modo ou de outro, somos todas filhas de alguém, e um dia podemos virar mães de alguém. Então refletir sobre o que cerca a maternidade, em paralelo ao que rodeia a vida sem filhos, também é uma forma de construir relações mais compreensivas entre nós.
Sobre a autora: Ana Luiza de Figueiredo Souza é mestre e doutoranda pelo PPGCOM da UFF, contemplada no Doutorado Nota 10 da FAPERJ. Graduada em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda pela UFRJ. Gestora de Produção de Conteúdo e Editoração do GP Tecnologias e Culturas Digitais da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). Coordenadora da equipe de revisão da revista Contracampo.
Integrante do grupo de pesquisa MiDICom. Consultora acadêmica e literária. “Ser mãe é f*d@!”: mulheres, (não) maternidade e mídias sociais expande os principais resultados de sua pesquisa de mestrado, vencedora do Prêmio Compós, o mais importante prêmio brasileiro para trabalhos acadêmicos na área de Comunicação.
Site: www.analuizadefigueiredosouza.com.br
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